O Canal Infantil recebeu vários e-mails de mães que não conseguem matricular seus filhos nas escolas que desejam, pelo fato do filho ter alguma necessidade especial. Já falamos aqui um pouco sobre educação inclusiva e entrevistamos uma pedagoga especialista em educação especial (Christianne Mukai) e uma terapeuta ocupacional (Bárbara Moura). Mas, como o fato é recorrente e de extrema importância, e eu sou formada em Direito, não podia deixar de entrevistar um advogado. O Canal Infantil conversou com o Dr. Tiago T. Vasconcelos, advogado e sócio do escritório Vasconcelos & Barcellos Advogados (Brasília, DF), que nos esclareceu sobre todas as questões legais que envolvem a matrícula em uma escola.

Em primeiro lugar, Dr. Tiago destaca que “o direito à educação da criança está previsto na Constituição Federal e na Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). A Constituição Federal de 1988 traz como direito social a ser garantido a todas as crianças a educação (art. 6º) e sendo dever do Estado e da família, com base nos princípios da igualdade de condições para acesso e permanência na escola, da gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais e da gestão de padrão de qualidade (arts. 205 e 206). O Estatuto da Criança e do Adolescente garante o direito à educação (art. 53) com o objetivo do pleno desenvolvimento da criança, do preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, sendo assegurado a igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, direito de ser respeitado por seus educadores, direito de contestar os avaliativos, o direito de organização e participação em entidades estudantis e o acesso à escola pública e gratuita próximo de sua residência. Ainda nessa lei, garante aos pais ou responsáveis o direito de ciência do processo pedagógico e a participação da definição das propostas educacionais”.

Outro ponto importante é a idade em que a criança deve entrar na escola. No Brasil, a educação é dividida em ensino infantil, ensino fundamental, ensino médio e ensino superior. “O Estatuto da Criança e do Adolescente e a Constituição Federal preveem o atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos de idade. No mesmo sentido vem a Lei nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), ao dispor que a educação infantil será oferecida em creches para crianças de até 03 (três) anos de idade e em pré-escola para as crianças de 04 (quatro) a 05 (cinco) anos de idade. O ensino fundamental obrigatório gratuito na escola pública e oneroso nos estabelecimentos particulares inicia-se aos 06 (seis) anos de idade, como traz o artigo 32 da Lei nº 9.394/96”, afirma o advogado.

“Desta forma, a criança pode exercer o direito à educação a partir de zero anos de idade quando estiver matriculada em creche ou aos 04 (quatro) anos de idade no ensino infantil e, obrigatoriamente, aos 06 (seis) anos de idade quando deve iniciar a educação fundamental”, ressalta Dr. Tiago.

Infelizmente, no Brasil, ainda existe muito preconceito, falta de preparo de algumas escolas para atender crianças com alguma necessidade específica. Mas é importante os pais saberem que, como explica Dr. Tiago, “todas as crianças têm direitos iguais, sem distinção de qualquer natureza, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.

Cabe ressaltar que, uma criança com alguma limitação deve ser respeitada e tratada como qualquer criança. O Dr. Tiago explica que “o direito à educação da criança não faz distinção entre as crianças, todas devem ser tratadas de forma igual. As limitações apresentadas pela criança, independente da natureza, devem ser trabalhadas pela instituição de ensino de forma a atender e trabalhar o desenvolvimento da capacidade de aprender e a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade”.

Sendo assim, os pais devem ter ciência que podem sim escolher a escola em que vão matricular o seu filho. “Os pais ou responsáveis tem a liberdade de escolher a escola que melhor atender as exigências subjetivas definidas por eles para educação da criança, independentemente de ser ou não estabelecimento de ensino especializada”, destaca Dr. Tiago.

Além disso, no caso de ser necessário um acompanhamento personalizado para a criança dentro da escola, o advogado afirma que “a responsabilidade é do estabelecimento de ensino assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar sistema educacional inclusivo, sendo vedada a cobrança adicional de qualquer natureza em suas mensalidade, anuidades e matrículas, como prevê o artigo 28, parágrafo 1º, do Estatuto da Pessoa com Deficiência”.

E mais, papais e mamães, segundo Dr. Tiago, a escola não pode recusar a matrícula de um aluno com necessidades especiais. “O Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) com intuito de proteger o direito à educação da criança com deficiência tornou crime a recusa, cobrança valores adicionais, suspensão, procrastinação, cancelamento ou fazer cessar inscrição de aluno em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, em razão de sua deficiência”, explica Dr. Tiago.

Este assunto, inclusive, ressalta o advogado, “já foi analisado pelo Supremo Tribunal Federal quando a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen) ajuizou ADI 5357, com o questionamento da constitucionalidade dos dispositivos do Estatuto da Pessoa com Deficiência que vedam as atitudes discricionárias das escolas. A Corte decidiu que as escolas particulares devem cumprir as obrigações de promoverem a inserção de pessoas com deficiência no ensino regular e prover as medidas de adaptação necessárias sem que ônus financeiro seja repassado às mensalidades, anuidades e matrículas”.

Sabemos que na prática, muitas vezes os pais passam por situações constrangedoras as conhecerem escolas e tentarem matricular os filhos. Nesses casos, a orientação do advogado é “procurar as autoridades competentes pela proteção dos direitos da criança e registrar os fatos que serão investigados, sendo elas: o Conselho Tutelar, a Delegacia de Proteção da Criança e Adolescente, o Ministério Público e a Secretária de Educação”. Cabe ressaltar que “a presença de advogado será obrigatória para garantir o direito dos pais ou responsáveis e da criança perante o Poder Judiciário, já que em razão da recusa pode gerar dano a ser reparado e/ou configurar crime”, afirma Dr. Tiago.

É importante dizer que o mundo tem mudado e os direitos da criança estão sendo mais divulgados e respeitados. As instituições de ensino também estão cientes das consequências jurídicas de seus atos. Ainda não vivemos em uma sociedade ideal, mas vamos lutar para chegar lá.

Por fim, o Dr. Tiago dá algumas dicas para os pais na hora de escolherem a escola:

“É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico e participar da definição das propostas educacionais, assim postura de funcionários da escola que limitam os pais ou responsáveis de conhecerem o estabelecimento de ensino quando da escolha para matricular a criança configura ofensa ao direito e para resguardar o bem tutelado deve-se buscar as autoridades competentes pela proteção dos direitos da criança, sendo elas: o Conselho Tutelar, a Delegacia de Proteção da Criança e Adolescente, o Ministério Público e a Secretária de Educação.

Procurar um advogado de confiança para assessorar neste momento, pode ser um grande auxílio para garantir o direito dos pais ou responsáveis e da criança; caso a família não tenha condições de contratar advogado, pode procurar as Defensorias Públicas ou Núcleo de Pratica Jurídica das Faculdades de Direito”.

Esperamos ter ajudado os pais que tanto lutam por seus direitos e pelo respeito aos seus filhos!

Se você tem dúvidas sobre qualquer assunto relacionado aos direitos das crianças, escreva para: carolina.canalinfantil@gmail.com

 

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