A matéria de hoje trata de um tema muito importante e ainda pouco conhecido: APRAXIA DE FALA. Devido à falta de informação, inclusive por profissionais da saúde, muitos pais não buscam a ajuda adequada para os filhos com apraxia. Para falar sobre o assunto, conversei com a Fonoaudióloga Infantil Nathalia Vieira; a Terapeuta Ocupacional Bárbara Moura e a Dayene Andrade que é psicóloga e mãe do Pedro, um garoto de cinco anos que tem apraxia de fala (@ligadopedro).

Para quem ainda não conhece, apraxia “é um distúrbio motor da fala que se torna aparente quando uma criança está aprendendo a falar. Chamamos de desordem neurofuncional e que, por razões ainda não totalmente compreendidas, crianças com apraxia de fala têm grande dificuldade em planejar e sequenciar os movimentos da língua, lábios, mandíbula e palato que são necessários para a fala inteligível”, explica Nathalia.

Dentre os sintomas mais comuns, a falta de fala é o que mais chama a atenção dos pais. Segundo a fonoaudióloga, “as crianças com apraxia são descritas como bebês silenciosos que tendem a não se engajar em jogos verbais. Em suas emissões inicias, a diferenciação dos sons é restrita e ocorre lentamente. O primeiro vocábulo normalmente aparece entre os 19 meses e os quatro anos de idade, a combinação de palavras também é tardia”.

Bárbara também destaca que “dentre os principais sintomas estão as alterações sensoriais (táteis, vestibulares, visuais, auditivas, orais e proprioceptivas). Cada criança apresenta essas dificuldades de forma singular. Outro sintoma é a dificuldade de planejamento para realizar ações como a fala, além de dificuldades como brincadeiras de subir em árvores, pular corda, andar de bicicleta, montar quebra-cabeça, seguir uma receita, as atividades de vida diária (vestir, banho)”.

O ideal, como em qualquer limitação que a criança possua, é o diagnóstico precoce. Porém, nem sempre ele é tão simples! Muitas vezes, só o pediatra não consegue definir a condição da criança. Sendo assim, ao perceber um atraso de fala, é muito importante uma avaliação fonoaudiológica. Pode ser um simples atraso ou algum transtorno de fala e linguagem. Por isso a avaliação é essencial! Como explica Nathalia, “o diagnóstico é feito, geralmente, após os três anos de idade, mas antes podemos levantar hipótese diagnóstica. O fonoaudiólogo capacitado e com experiência em transtorno de fala e de linguagem, incluindo os distúrbios motores de fala, é o profissional apropriado para avaliar e diagnosticar a apraxia de fala na infância”.

Em alguns casos, a apraxia é confundida com outros transtornos, como o autismo, por exemplo. Nathalia destaca que “a apraxia pode vir como comorbidade do autismo. Diferentemente do autismo, a apraxia, por si só, não gera transtorno ligados à socialização”. Por isso o diagnóstico correto é muito importante! Nathalia explica que “a criança, com a intervenção adequada, tem grandes chances de desenvolver a fala. Mas devem-se levar em conta as comorbidades envolvidas”.

Uma criança com apraxia de fala, além do acompanhamento médico, são necessárias sessões de fonoaudiologia e terapia ocupacional. O fonoaudiólogo, como explica Nathalia, “é o profissional que irá liderar a equipe, sendo muito importante o trabalho com a terapeuta ocupacional, principalmente. Por se tratar de uma desordem que acomete a fala, o fonoaudiólogo é quem irá tratar desse transtorno que, na grande maioria das vezes, vem associado ao transtorno do processamento sensorial onde entra o trabalho da terapeuta”.

Bárbara Moura e Pedro durante sessão de terapia ocupacional

Como destaca Bárbara, “a terapia ocupacional é a ciência que estuda a ocupação humana, tudo aquilo que o indivíduo é capaz de realizar e produzir faz parte do conjunto de saberes da terapia ocupacional. O fazer humano, também denominado práxis (do grego), é o mesmo de a ação humana. Tudo aquilo que fazemos e produzimos, primeiramente passa pela idealização, planejamento, ação e resultado, sendo, estes últimos, frequentemente diferentes do idealizado. Então, quando falamos de apraxia de fala na infância, estamos falando em uma dificuldade de realizar o ato de falar. A criança tem a idealização da fala, mas o planejamento de como irá fazer e a ação são prejudicados. Com isso gera a sensação de frustrações recorrentes, desorganização sensorial, pois a dificuldade em planejar e realizar traz informações equivocadas para o cérebro, podendo ter crianças mais agitadas, ou hipoativas, com alterações sensoriais táteis, vestibular, oral, visual e auditivas”.

Cabe ressaltar então que, “a terapia ocupacional irá auxiliar as crianças com apraxia de fala na sua organização sensorial, por isso é necessário um profissional capacitado em integração sensorial e com recursos adequados. Também é necessário auxiliar a criança com estratégias e treinos constantes para ajudá-la com o planejamento global, afinal, a grande maioria das crianças com apraxia de fala possui apraxia global do desenvolvimento”, afirma Bárbara.

Apesar de fundamentais, somente as terapias em consultório não são suficientes para a criança! É imprescindível o apoio da família! É preciso que a criança realize as atividades em toda a sua rotina e em todos os ambientes. “O tratamento é realizado com a participação efetiva da família, pois a repetição do ato desejado é primordial para obtermos sucesso”, alerta Bárbara.

Nathalia também é da mesma opinião: “a família é quem irá realizar o treino mais sistemático. A base do tratamento de crianças com apraxia é a repetição. A família engajada é quem faz toda a diferença no tratamento, fornecendo sempre o feedback para o profissional. Quem entende de apraxia é o profissional, mas quem entende do filho são os pais, por isso é necessário alinhar as demandas e definir metas. Sempre orientando os pais”.

Nathalia Vieira e Pedro durante sessão de fonoaudiologia

A Dayene, mamãe do Pedro, conta que não foi nada fácil descobrir o diagnóstico do filho. “Ele entendia tudo, mas não conseguia se expressar por meio da fala. Ele utilizava gestos, fazia de tudo para ser entendido e, se não conseguia o que queria, ele mesmo ia resolver sua questão sozinho. No início, Pedro falava ‘mamã’ para tudo. De vez em quando falava uma palavra e depois não repetia mais. Comecei a observar algumas questões sensoriais,comportamentais e uma enorme agitação. Além disso, demorou a desenvolver algumas habilidades como bater palmas, pular, dar tchau, além de outras esperadas para sua idade. Mandava beijo, buscava interação com outras crianças, escutava bem, respondia os comandos, mas não falava”, explica Dayene.

Com todas essas observações, a família foi atrás de respostas. “Levei em alguns neurologistas e psiquiatras que descartaram outros diagnósticos. Fiz com otorrino todos os exames auditivos, que excluíram problemas na audição. Além disso, vários fonoaudiólogos diziam que ele só tinha um atraso de fala normal. Só que eu percebia que as terapias de fala não estavam dando certo, então, comecei a estudar e li sobre apraxia de fala na infância. Vi que tudo se encaixava! Com isso, descobri que somente uma fonoaudióloga, que realmente conhecesse de apraxia de fala na infância, poderia me dar esse diagnóstico. Foi aí que uma mamãe me indicou algumas profissionais. Uma delas foi a fonoaudióloga Erika Campos, em Curitiba. Como moro em Belo Horizonte, a Erika me indicou a Nathalia Vieira. Foram elas que me deram o diagnóstico de apraxia de fala e ajudaram o Pedro a falar suas primeiras palavras. Pedro tem apraxia de fala na infância grave, distúrbio de Coordenação do Desenvolvimento e transtorno do processamento sensorial”, conta Dayene.

A família é o grande porto seguro para a criança! “Com o apoio familiar, o Pedro sabe que pode contar com a gente para entender suas limitações e para ajudá-lo a se desenvolver. Temos a responsabilidade de dar a ele força para enfrentar seus desafios diários. Trabalhar sua autoestima e nunca deixar que ele desista! Estamos incentivando-o o tempo todo. Temos que fazer treinos diários serem funcionais e divertidos para que o Pedro possa desenvolver suas habilidades de forma prazerosa. Essas atividades sempre acontecem de acordo com as orientações da fonoaudióloga e da terapeuta ocupacional que acompanham o Pedro. A criança com apraxia de fala na infância precisa de muito treino e a família tem papel importante nessa jornada”, alerta Dayene!

Dayene com seu filho Pedro

Não faltam amor e carinho para ajudar o Pedro nesta caminhada! “Para nós, o que importa é que ele está evoluindo! Apraxia de fala grave, como é o caso do Pedro, na maioria das vezes, tem evolução a passos de formiguinha. Porém, o importante é que ele está agora recebendo o tratamento correto. Hoje, graças ao trabalho das fonoaudiólogas, ele fala muitas palavras durante a terapia e até mesmo no dia a dia, quando estimulado. No entanto, a maioria das palavras ainda não sai espontaneamente na rotina. Ele aprende palavrinhas novas, desaprende e depois aprende novamente… É um treino constante! Pedro também tem evoluído muito por causa do bom trabalho da terapeuta ocupacional, que realiza exercícios de integração sensorial e psicomotricidade. Também está bem melhor com relação a manter o foco e mais organizado. Porém, ainda têm muitas questões para serem trabalhadas, como processamento auditivo, visual e com relação ao comportamento. Iremos iniciar outras terapias também”, explica Dayene.

Para terminar, deixo aqui um recado da Dayene para outras mamães que passam pela mesma situação: “as limitações da fala de nossos filhos não os limitam para a felicidade! Sei que muitas vezes não é fácil enfrentar o dia a dia, ou até mesmo o preconceito. Mas acredito que uma criança com apraxia vem com um dom de enfrentar desafios; elas são mais fortes do que imaginamos! E a gente só precisa mostrar o enorme orgulho que temos por elas, assim, elas se sentirão amadas! Há muito a se fazer por uma criança com apraxia, por isso é importante que nós, os familiares, não deixemos de estudar e procurar cada vez mais o melhor para nossas crianças. Quero falar da importância da Abrapraxia para pais, profissionais e todas às pessoas que rodeiam as crianças com apraxia. No site http://apraxiabrasil.org/ encontram-se muitos cursos para conhecer melhor sobre apraxia de fala. É muito importante divulgar a causa para que mais crianças não recebam o diagnóstico tardio, como o Pedro, diagnosticado com quase cinco anos de idade. Este outro site também traz muitas informações http://www.atrasonafala.com.br/”.

Então, papais e mamães, estejam sempre atentos aos seus filhos! Qualquer dúvida no desenvolvimento deve-se consultar o pediatra e procurar os profissionais adequados para o tratamento.

 

Bárbara Moura é Terapeuta Ocupacional e parceira do Canal Infantil.

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