Alimentação é um dos assuntos que mais preocupam os pais! É muito comum, em consultas com o pediatra, os pais reclamarem que o seu filho não come nada ou come mal. Saibam que isso é normal! Acontece em várias famílias! Aqui em casa, por exemplo, o Matheus está passando por uma fase difícil de alimentação. Come só o que quer e quando quer. Ele nunca foi de comer muito, mas sempre comeu bem. Eu confesso que tem dias que fico desesperada! Mas, como ele está crescendo e ganhando peso, menos mal! Além disso, levo-o ao pediatra sempre para avaliar!

Porém, a alimentação não é só um ato motor (comer), mas também um ato sensorial, emocional… É preciso entender os motivos por trás da recusa alimentar de uma criança.

Entrevistei a terapeuta ocupacional Amanda Dupin e a fonoaudióloga Mariana Pantuso, do Fome de Gosto (Belo Horizonte, MG) para poder entender melhor como funciona a alimentação.

A criança, desde o ventre materno, já se alimenta. No entanto, é quando ela nasce que começa, efetivamente, o ato de se alimentar via oral. Quando bebê, inicia-se o processo pela amamentação. Segundo as profissionais, “a maioria dos bebês nasce com prontidão para sugar. É um reflexo de sobrevivência para saciar a fome e ajudar o bebê a se acalmar. A sucção no seio da mãe é fisiológica e​ é mais adequada para o desenvolvimento orofacial”.

Entretanto, é importante ressaltar que, “embora a amamentação seja fisiológica e natural, ela nem sempre é automática. Em alguns casos são necessários ajustes para a pega correta no seio. E, em todos os casos, as mães precisam de apoio! Quando a amamentação ao seio não é possível, temos alternativas como o copinho e a mamadeira. Cada caso deve ser avaliado e orientado individualmente. Seja no seio ou na mamadeira, a experiência motora de sucção é uma preparação para o controle motor necessário para a mastigação ou até mesmo para a fala”, destacam Amanda e Mariana.

Após os seis meses, quando se inicia a alimentação sólida, é importante que os pais tenham um acompanhamento com o pediatra periodicamente. Ele é quem vai constatar se o seu filho está dentro das curvas de crescimento e peso adequadas para a idade. Além disso, serão também observados qualidade dos alimentos, se há ou não recusa de algo específico etc.

Para saber se o seu filho come mal ou não, Amanda e Mariana recomendam que “em primeiro lugar, deve-se estar atento ao crescimento e ao ganho de peso. A criança sempre deve ser acompanhada pelo pediatra para acompanhamento clínico. Se há algum problema nessa área, a alimentação deve ser investigada. Existem algumas crianças que estão crescendo de acordo com a curva prevista, mas, em determinados aspectos, a alimentação está trazendo um desgaste ou uma preocupação para os pais. Muitas vezes, recebemos mães ou pais que falam que o filho não come, sendo que a criança come, mas apresenta recusas ou dificuldades importantes. E isso impacta muito na qualidade de vida de toda a família. Por isso, a queixa deve ser investigada com um olhar ampliado. Quando a criança apresenta seletividade e recusas para todo um grupo de alimentos, por exemplo, carnes ou verduras, é preciso procurar ajuda. Assim, como em casos de aversão total a algumas texturas ou consistências”.

Como bem colocaram as profissionais, existe sim a questão sensorial na alimentação. Muitas vezes, a criança recusa certos alimentos, não por     que não gosta, mas pelo fato de terem algum tipo de incômodo (gastura) com determinada textura. Elas explicam que é muito importante, desde a introdução alimentar, que os pais busquem variedades nos alimentos. “A introdução alimentar com diferentes texturas garante um repertório maior de experiências orais. Quanto mais texturas experimentamos, melhor vamos lidar com o novo ou com mais propriedade vamos identificar o que gostamos ou não.

Mas é importante ressaltar que essa variedade de texturas não deve ser ofertada à criança de uma só vez.

Não precisa colocar todas as texturas em uma só refeição, principalmente no início da introdução da alimentação sólida. Mas não devemos variar somente as texturas, é preciso lembrar que os alimentos também tem cores, sabores e cheiros diferentes. Tudo isso deve ser considerado em uma alimentação rica em variedade”, afirmam Amanda e Mariana.

Cabe ressaltar também que existem algumas questões que devem ser observadas pelos pais e relatadas ao pediatra.

ENGASGOS

Se a criança apresenta engasgos frequentes quando se alimenta, tem algo errado. É muito importante que ela seja avaliada por um profissional. Amanda e Mariana destacam que “os engasgos são sinais de alerta para quando o alimento segue para a parte respiratória do nosso corpo, a caminho dos pulmões. O bebê tem o reflexo de vômito mais anteriorizado, ou seja, mais próximo da região dos lábios, ​exatamente como defesa, pois ainda está aprendendo a coordenar os movimentos orais e a respiração. À medida que vivencia experiências orais, vai se adaptando aos novos alimentos sem engasgar. Engasgos frequentes devem ser avaliados em qualquer fase da vida”.

FICAR COM O ALIMENTO MUITO TEMPO NA BOCA (SEM ENGOLIR)

“O tempo que o alimento permanece na boca até a deglutição é chamado de trânsito oral. Esse varia de acordo com os alimentos, ou seja, alimentos líquidos tem menor tempo de trânsito oral do que os sólidos, que exigem a mastigação. O trânsito oral aumentado ou diminuído pode indicar dificuldades na mastigação e nas habilidades sensório-motoras orais”, destacam as profissionais.

DEIXAR O ALIMENTO ESCAPAR DA BOCA ANTES DA DEGLUTIÇÃO

Segundo Amanda e Mariana, “o escape anterior de alimentos pode acontecer durante a aprendizagem alimentar da criança, como na introdução de alimentos pastosos. Esses escapes duram até 15 dias normalmente. Quando existe fraqueza na musculatura orofacial, de lábios principalmente, os alimentos podem escapar com maior frequência. Os escapes frequentes e constantes precisam de avaliação e tratamento, na maioria das vezes”.

Além da consulta com o pediatra, é válido, nos casos acima, uma avaliação com o fonoaudiólogo.

“Ele é quem avalia e detecta as dificuldades nas  habilidades oromotoras da criança, e ainda é capaz de identificar alterações no processamento sensorial. Com uma visão mais ampliada, o fonoaudiólogo também atua além desses aspectos levando em consideração o ambiente, a pessoa que alimenta, a autonomia da criança, por exemplo”, destaca Mariana.

Nas questões alimentares, segundo a fonoaudióloga, “o profissional vai atuar, por meio de técnicas específicas, diretamente no desenvolvimento das habilidades orais e para que a criança recupere o desejo e o conforto para se alimentar. Além disso, nossa atuação se estende a orientações familiares para que a relação com a comida de toda a família seja mais saudável, tendo impacto direto no repertório alimentar da criança”.

Como a alimentação também pode ser afetada por questões sensoriais, motora, comportamental e emocional, o terapeuta ocupacional pode ajudar muito.

Amanda explica que, “quando qualquer um desses fatores se evidencia, o terapeuta ocupacional pode intervir. Ele avalia possíveis desordens na integração sensorial; propõe estímulos adequados, para facilitar a aceitação de um repertório alimentar mais diversificado; auxilia o processo de autoconhecimento e amadurecimento da criança; capacita a família na organização da rotina alimentar e na adequação das respostas dos pais diante de um comportamento infantil inadequado”.

Os pais devem ter em mente que eles podem sim ajudar (e muito) os seus filhos na alimentação. Mas, nem sempre eles conseguem. Pedir ajuda a um profissional não significa fraqueza, falta de amor ou de atenção. Pelo contrário, mostra preocupação e muito amor pelo filho!

Amanda e Mariana dão as seguintes dicas para os pais:

“É importante valorizar e trazer a criança à mesa durante as refeições em família, desde cedo. Cuidar do ambiente de refeição proporcionando presença, liberdade e nutrição de sentimentos além dos alimentos. Diminuir a pressão sobre o quanto a criança come, principalmente no primeiro ano, em que a criança deve ter muitas oportunidades de vivências com sabores, cheiros, texturas e consistências diferentes. Respeitar e procurar entender as possíveis  dificuldades e preferências alimentares. Além disso, os pais devem estar atentos que o modelo é a lição mais importante para a criança, que está sempre atenta a tudo que os pais fazem e falam”.

Vale ressaltar que “para abordar a dificuldade alimentar de uma criança, o olhar deve ser ampliado para além do momento da refeição. A organização da casa, das compras, o ato de preparação, o ambiente de oferta do alimento, o horário da refeição, quem acompanha a criança nesse momento, a quantidade ofertada e aceita, a autonomia que se permite para a criança, quem ela vê comendo e o que ela vê as outras pessoas comerem, além do perfil de resposta sensório-motoras da criança. Tudo isso deve ser levado em conta em casos de dificuldade e/ou recusa ou obesidade infantil”, destacam Amanda e Mariana.

É preciso, papais e mamães, muita calma e paciência. Mas tudo se resolve! A criança passa por várias fases e é preciso ajudá-la sempre! Sejam exemplos na vida dos filhos!

 

Têm dúvidas? Escreva para: carolina.canalinfantil@gmail.com

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